Padre com mamilos
- walter tierno
- 3 de out. de 2022
- 3 min de leitura
O "padre" que se apresenta como candidato (cabo eleitoral) a presidente me fez lembrar um caso que presenciei em 2011.
A literatura fantástica brasileira ensaiava mais um voo de galo e, no meio de muita coisa boa sendo produzida, claro que tinham os que publicavam obras irrelevantes em busca de devaneios de sucesso rápido e impossível. Entre esses, um sujeito pagou para imprimir um livro que se dizia "o primeiro livro de super herói brasileiro". Não lembro o nome. Lembro que a capa trazia um tipo de faraó bombado com escorpiões nos mamilos. Ele montou um site sobre o livro. Nele, dizia que, em breve, e durante uma entrevista no programa do Jô Soares, para a qual dizia estar convidado, revelaria qual era o grande estúdio de cinema que havia comprado os direitos do livro. Também tinha, nesse site, vários logotipos de grandes empresas, apontadas como patrocinadoras. Entre elas, Coca-Cola e Pepsi.
É... aparentemente, as duas entraram em acordo para patrocinar o mesmo projeto. Algo inédito!
A verdade óbvia era que o rapaz acreditava que, se conseguisse fazer bastante barulho com esses absurdos, ganharia alguma vantagem comercial. Quem sabe, em sua fantasia, não acontecesse o que ele alegava? Quem sabe o Jô não o chamaria para conversar sobre sua brilhante estratégia? Quem sabe algum estúdio não comprasse seu livro? Uma mentira contada muitas vezes não vira verdade?
Nem vou entrar no mérito de que ele apelou a uma tática popularmente nazista...
Claro que o engodo não deu certo.
Mas mentiras não são tão simples assim. Mesmo as óbvias.
Houve blogs – era o formato que mais dava visibilidade ao mercado editorial na época – que chegaram a dar espaço para o cara. Claro, o mercado está cheio de amadores e isso não é uma exclusividade veicular ou temporal. E claro, também, que a coisa não foi longe.
Mas fato é que um picareta avançou mais do que manda o simples bom senso. Mesmo que tenha sido tão pouco.
E muitos outros e outras, dentro dessa bolha literária, surgiram e avançaram o mesmo tanto: Muito pouco, mas mais do que deveriam.
Mentira tem pernas curtas, é fato. Mas a analogia é precisa. Pernas curtas também correm, mesmo que a distância seja menor. Também chutam, mesmo que o golpe tenha menos potência. Também fazem estrago.
O rapaz do super herói com mamilos de escorpiões não foi longe. Mas arranhou algumas credibilidades, causou desconforto e frustração. Talvez mais do que amadurecimento.
Sempre me questiono se o aprendizado tem que vir do embate com a canalhice. Talvez tenha, sei lá. O canalha não o deixa de ser por ser instrumento de percepção.
Além disso, todo esse engodo era desrespeitoso com quem trabalhava seriamente, com quem contribuía com a literatura e a cultura. Eu, sem falsa modéstia, sentia-me desrespeitado. Todas e todos deveríamos nos sentir.
Na época, cheguei a ouvir de pessoas próximas, quando as questionei sobre a veracidade das alegações do autorzinho, um "não sei, 'vai-que'".
Guardadas as devidas proporções, quantos por aí não olham para o padre que apareceu como candidato do PTB e não dizem, ao medo de ofenderem a fé alheia, um "vai-que"? E quantos não acreditam ainda que ele é um padre? Só porque ele o diz. As igrejas ortodoxa e católica já disseram que de suas fileiras ele não surgiu.
Papagaios podem dizer "sou padre", "me respeite", "somos oitenta porcento". Falar é fácil. Mentir, idem.
Esse sujeito veio de alguma seita latino-americana que só Deus sabe para que vantagens foi criada e nem me interessa. É um farsante. Um embuste. Um canalha. Não se permitam amedrontar por suas ameaças vãs. Seus discursos. Não há fé a ser desrespeitada quando se trata de tal laia. Pois ele não representa nada que seja bom. Tudo mentira. Tudo falso. Numa fantasia canalha e desrespeitosa.
Quando olho para ele, vejo uma fantasia. E escorpiões em seus mamilos.
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